Nos seus três primeiros mandatos como prefeito de São Caetano, José Auricchio Júnior (PSD) construiu uma reputação de gestor meticuloso, reconhecido por controlar os gastos com rigor. A imagem de administrador técnico e zeloso conferiu a ele respaldo político e confiança da população. Com base no histórico, iniciou o quarto governo sob a mesma aura de competência, cercado por aliados e conselheiros que, como na fábula de Hans Christian Andersen, celebravam suas decisões sem contestação. A unanimidade em torno de sua figura afastou qualquer suspeita de descompasso entre discurso e prática. Como no conto, em que o monarca desfilava orgulhoso acreditando vestir um traje que só os inteligentes podiam ver, o ambiente político passou a refletir uma espécie de cegueira coletiva.
A ausência de vozes dissonantes favoreceu uma guinada na condução administrativa. No último ano de governo, obras de grande porte surgiram em ritmo acelerado. Algumas delas, com pouca justificativa técnica ou sem a devida projeção orçamentária, indicavam mais a intenção de marcar uma despedida vistosa do que atender a demandas da população. Foi nesse contexto que reportagens deste Diário começaram a desmontar o conto de fadas. Nada como um observador atento – igualzinho ao menino da fábula que expôs a nudez do imperador – para chamar atenção para a realidade. Em apenas 12 meses, a dívida da cidade saltou de R$ 429 milhões para R$ 824,9 milhões, sem contar os R$ 300 milhões em compromissos deixados para o governo seguinte.
Símbolo máximo da desconexão do chefe do Executivo com as ruas foi o Pronto Cardio, unidade vascular de alta complexidade anunciada como marco da gestão, mas entregue incompleta e sem condições mínimas de funcionamento. Inaugurado às pressas nos últimos dias do mandato, o hospital representou o auge de um ciclo marcado por decisões que ignoraram alertas técnicos e comprometeram o futuro orçamentário do município. Tal como o imperador do conto infantil, Auricchio acreditava desfilar sob o aplauso geral, quando, na verdade, expunha uma administração que já não se sustentava nos mesmos pilares que a consagraram. O que se viu, ao fim, foi um governo encerrado sob a revelação incômoda de que o traje era imaginário – e o rei, enfim, estava nu.
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